entrevista com Sérgio Mamberti - Orçamento é `irreal` para que Funarte cumpra seu papel

Fonte: Agência Brasil - Amanda Cieglinski - em 16/11/1008
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DISTRITO FEDERAL, Brasília - Sergio Mamberti, indicado para a presidência da Funarte, fala na abertura do encontro nacional dos Pontos de Cultura, Teia Brasília 2008, no Teatro Nacional.
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Na próxima segunda-feira (17), o ator e militante histórico da área cultural Sérgio Mamberti assume oficialmente a presidência da Fundação Nacional de Artes (Funarte), vinculada ao Ministério da Cultura, depois de uma saída conturbada do também ator Celso Frateschi, que ocupou o cargo até outubro.
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Mamberti deixa a Secretaria de Identidade e da Diversidade Cultural do ministério para assumir o principal órgão responsável pela execução das políticas públicas de incentivo à cultura. A Funarte é responsável pela análise de projetos entregues ao governo que precisam de captação de recursos. A fundação recebe cerca de 2 mil pedidos por mês.
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Em entrevista exclusiva à Agência Brasil, Mamberti diz que está animado com o desafio e espera poder contribuir para o processo de revitalização da entidade. Na década de 90, a fundação sofreu com desmonte das instituições culturais promovidas pelo governo Collor. Mamberti afirma que pretende dar uma “outra cara” à Funarte, “à altura de sua tradição, mas com visão de futuro”.
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Agência Brasil: O ministro da Cultura, Juca Ferreira, falou recentemente da necessidade de se reformular a Funarte. O senhor acha que esse será o principal desafio da sua gestão?
Sérgio Mamberti: Eu acredito que sim. O presidente Antônio Graça, quando assumiu em 2003, já tinha a preocupação de revitalização e reestruturação da Funarte. Ele tomou uma série de medidas efetivas e outras simbólicas, como a recuperação do Projeto Pixinguinha. De uma certa maneira, ele reconstituiu a presença da Funarte no Ministério da Cultura. Depois ele saiu, veio o Celso [Frateschi], cuja gestão teve alguns impasses, mas ele também foi importante. Sempre pode acontecer de ter uma incompatibilidade de visões e acho que essa questão nem vem ao caso, porque no momento a crise já foi superada. Eu venho aqui um pouco como continuador de um trabalho.
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ABr: Quais são suas expectativas e planos para a Funarte?
Mamberti: Eu fico muito feliz de poder dar essa contribuição. Tenho uma longa militância e espero contribuir. Acredito que trabalhando colegiadamente vamos sair um pouco dessa estrutura um pouco piramidal da Funarte. Por meio dos diretores de cada uma das áreas e de um conselho que queremos estabelecer nos moldes do que existe no Iphan [Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional], vamos estabelecer uma participação efetiva da comunidade cultural. Isso vai me deixar mais confortável na minha missão. Não vou me sentir tão quixotesco. De qualquer maneira, eu fico preocupado, mas acho que consegui resultados muito bons na Secretaria de Identidade e da Diversidade Cultural e o ministério está em um momento muito bom. Não digo que em dois anos vamos mudar a Funarte, seria uma pretensão da minha parte, mas vamos fazer mudanças importantes e construir um processo que leva a Funarte para frente.
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ABr: Hoje a Funarte só tem representação em Brasília, São Paulo, Minas Gerais e Pernambuco. Há planos para expandir essa atuação?
Mamberti: Sim, nós temos que aumentar a representação da Funarte no Brasil, ela precisa ser bem maior. Outro ponto importante é que a gente quer que a representação nacional se consolide. Estamos trazendo o corpo administrativo para a sede [em Brasília], como o estatuto prevê. O Iphan funciona assim, o seu corpo funcional fica lá no Rio de Janeiro e a administração em Brasília. Na minha gestão, eu quero contar, em primeiro lugar, com os funcionários. Eu saí de uma secretaria de 30 pessoas para uma fundação com 600. Eu sinto no corpo funcional uma vontade muito grande de participar.
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ABr: Um dos principais problemas hoje na Funarte é a demora para a análise dos projetos, como está caminhando a informatização e modernização desse processo?
Mamberti: Um dos desafios importante é dar mais agilidade à apreciação e análise dos projetos. A informatização está caminhando com bastante rapidez. O artista ou produtor cultural poderá fazer um projeto totalmente de forma informatizada. Quem não tem acesso à internet pode mandar pela forma tradicional. Esse conjunto de medidas que vão ser tomadas já estão em andamento de uma certa maneira. É por isso que eu tenho a esperança de que nesses próximos dois anos vamos dar uma outra cara à Funarte, à altura de sua tradição, mas com uma visão de futuro. Houve na história da Funarte alguns traumas que precisam ser superados e o caminho é justamente esse espírito de dimensionar a fundação para os dias de hoje.
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ABr: Qual será o papel da Funarte nesse processo de mudança com o fim da Lei Rouanet e a criação do Programa Nacional de Financiamento e Fomento da Cultura?
Mamberti: A Funarte tem um papel importantíssimos que é dar os pareceres [para o financiamento dos projetos], teremos a missão principalmente de dar mais agilidade a isso. Nós estamos aí com uma conquista, porque as emendas [parlamentares] que vão sair possivelmente irão dotar a Funarte com orçamento.
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ABr: Os recursos que a Funarte tem hoje são suficientes para atender a toda a demanda?
Mamberti: Nós temos um orçamento reduzido. Nós estamos trabalhando com um sistema nacional de cultura em que os recursos diretos possam ser compatíveis com o papel estratégico da cultura. O orçamento de 2007 foi em torno de R$ 58 milhões, sendo que apenas R$ 20 bilhões eram para investimentos nas ações finalísticas e o restante, para custeio. É impossível com o leque de ações que Funarte tem e seu espectro dentro do plano das artes no Brasil você querer fazer um projeto com R$ 20 bilhões. É absolutamente irreal.
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ABr: Há previsão para o orçamento de 2009? Ele será maior?
Mamberti: Ele ainda está sendo finalizado. E essa é uma luta. Nós saímos de uma faixa de 0,2% para 0,8% [do Orçamento Geral da União]. Mas devemos comemorar quando tivermos pelo menos 1%. E isso será quando a PEC 150 [Proposta de Emenda Constitucional 150/2003, que atende à recomendação da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) de destinar pelo menos 1% de toda a arrecadação do governo ao setor] for aprovada, garantindo 2% para a cultura.
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ABr: Outros projetos como o Vale-Cultura e a Loteria da Cultura poderiam desengessar essa questão do orçamento? Eles saem ainda no governo atual?
Mamberti: Podem demais. E as emendas também. Nós temos hoje uma frente parlamentar de apoio à cultura extremamente eficiente e suprapartidária. Ou seja, é um momento novo, nós conseguimos sensibilizar não só a sociedade, mas o Executivo e o Legislativo. Eles saem sim, estou muito otimista.
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ABr: O ex-presidente Celso Frateschi tinha uma preocupação grande com o circo e outras áreas da cultura que recebem menos apoio. Qual é a opinião do senhor sobre o assunto?
Mamberti: Certamente vamos olhar pelo circo, eu tenho um carinho muito especial pela área. Hoje a dança é o setor mais carente, é onde os investimentos foram menores. A ópera também está muito abandonada, nós temos pouca representatividade dentro do ambiente da Funarte. Tudo isso eu pretendo reconstruir com o meu time, com a sociedade e o ministério, para conseguir os resultados esperados. O trabalho hoje é no sentido de ter um novo ministério que possa responder aos desafios de um conceito de cultura mais amplo que vai além das artes.