arte brasileira contemporânea, salto nas exportações

O salto da exportação de arte 'made in Brazil'
De 2005 a 2010, setor cresceu 500% e exportou US$10 milhões. Especialista critica falta de política de retenção de obras.

fonte: o Globo, por Eliane Oliveira, em 29/05/2011

Um setor vem se sobressaindo, juntamente com as commodities, na balança comercial brasileira: o de artes plásticas contemporâneas. A criatividade de artistas brasileiros que lotam galerias de arte no exterior fez com que as exportações de quadros, gravuras, colagens e estampas aumentassem quase 500% nos últimos quatro anos, de US$ 1,9 milhão, em 2005, para US$ 10,047 milhões, em 2010, apesar do dólar desvalorizado, da elevada carga tributária e das dificuldades logísticas.

Não fosse a crise financeira internacional, a expansão seria ainda maior, de 686%, uma vez que, em 2009, o total vendido foi de US$ 14,934 milhões. Esse montante não chega perto da média de US$ 10 bilhões mensais em exportação dê commodities agro-pecuárias, minerais e metálicas. No entanto, segundo o presidente da Agência de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), Maurício Borges, há um esforço bem-sucedido das galerias de arte e outros representantes do setor.

A arte brasileira contemporânea faz sucesso no exterior com nomes como Cildo Meireles, Waltercio Caldas, José Resende, Beatriz Milhazes, Adriana Varejão, Ernesto Neto, Tunga, entre tantos outros. Estados Unidos, Suíça, Inglaterra, Espanha, França e México lideram a lista de mercados para as exportações.

— Além da participação em feiras, exposições e missões internacionais, ajuda a melhorar o perfil exportador o posicionamento político adotado pelo Brasil em áreas como a ambiental e a social. Isso atrai o interesse de pessoas que desconhecem o potencial artístico — diz Borges.

Mercado interno preocupa especialistas

O professor e crítico de arte Paulo Sérgio Duarte concorda com essa avaliação e diz que o Brasil tem artistas com as mais interessantes investigações estéticas contemporâneas. Contudo, ele destaca que sua maior preocupação é com o mercado interno, que, embora mais consistente do que em anos atrás no eixo Rio-São Paulo-Belo Horizonte, carece de políticas públicas para a formação de acervos. Essa deficiência ocorre de forma gritante em Brasília, capital do país.

— Se chega algum chefe de Estado no Brasil, não há uma sala Portinari, Volpi ou outro pintor do século XX, formada por oito a 12 obras — completa Duarte.

O curador da Pinacoteca de São Paulo, Ivo Mesquita, desconhece dados mercadológicos, mas reconhece que o interesse pela arte brasileira é crescente.

Alguns especialistas, como o curador, perito judicial e agenciador de arte Ricardo Barradas, por outro lado, apontam falhas justamente na exportação de obras importantes. Para ele, falta na legislação um dispositivo que impera casos como o da vedda do "Abaporu", quadro pintado por Tarsila do Amaral na década de 20 do século passado. O colecionador argentino Eduardo Constantini o comprou em 1995 por cerca de US$ 1,5 milhão.

Agora, Constantini, que expõe o quadro em um museu de Buenos Aires, não aceita vendê-lo por nada. Recusou, recentemente, uma oferta de empresários brasileiros no valor de US$ 40 milhões. Argumenta que tem em mãos uma obra que levou Oswald de Andrade a criar o Movimento Antropofágico, com a intenção de "deglutir" a cultura europeia e transformá-la em algo bem brasileiro.

— Um quadro como o "Abaporu", por seu valor histórico, nunca deveria ter saído do país — afirma Barradas, que foi um dos que tentaram, em vão, agenciar a venda da obra a grandes empresas brasileiras. — As empresas preferiram investir na Fórmula-1. Faltam gestores especializados no país.

De acordo com o Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional Ophan, a legislação brasileira só proíbe a saída do país de obras do período monárquico ou as tombadas, como, por exemplo, diversas de Portinari. Embora a venda do "Abaporu" tenha ocorrido há 15 anos, não haveria nada que impedisse a operação novamente.

Jã para João Carlos Lopes dos Santos, perito judicial e consultor nas áreas do mercado autoral, de arte e de entretenimento, não há problema algum em não haver retenção de obras de arte no Brasil:

— É melhor que esteja em um museu, onde as pessoas possam vê-lo, do que ficar encostado em alguma residência ou algum acervo. O importante é o reconhecimento do público, não importa onde o quadro fique.

Preço no Brasil é bem menor que no exterior

Lopes dos Santos destaca que um diferencial importante entre o Brasil e o exterior é o preço. Os valores praticados aqui são bem inferiores aos pagos pelas clientelas americana e europeia.

— Uma coisa é a criatividade e o talento do artista, e outra é o mercado local. A arte brasileira ainda não atingiu um patamar de preço equivalente ao praticado nos EUA e Europa.

A professora e pesquisadora do Instituto de Artes da Uerj Denise Espírito Santo acredita que houve grande avanço no Brasil nos últimos 15 anos.

— Se formos olhar para trás, a década de 80 foi obscura e, desde meados da década de 90, o setor começa a se organizar. O Brasil tem estrutura legal comparada à do Primeiro Mundo. No entanto, é preciso estimular não só a arte que vende, mas outros circuitos fora das grandes capitais. Há muita coisa interessante na periferia — afirma ela.

O premiado pintor Galeno é um exemplo de artista mais conhecido no exterior do que dentro do próprio pais, à exceção de Brasília. Seus quadros foram dados de presente a chefes de Estado estrangeiros por praticamente todos os presidentes brasileiros no período de Fernando Collor a Luiz Inácio Lula da Silva. Os ex-presidentes americanos Biil Clinton e George W. -Bustí; o fràricês Jácques Chirac; o ex-chanceler alemão Helmut Kohl; e o russo Vladimir Putin estão entre os agraciados. Assim, Galeno se projeta lá fora e abre caminho para os mais jovens, graças aos diplomatas que compram sua arte.

— Já aconteceu de, em uma casa em Pequim, o convidado pedir informação sobre meu trabalho e me encontrar. Isso se repetiu em outros países — conta o artista, que tem um ateliê na cidade-satélite de Brazilândia.