exposição - Temporada na temporada

fonte: Revista - Fundação Iberê Camargo
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Em cartaz no Paço das Artes, em São Paulo, a Temporada de Projetos na Temporada de Projetos faz uma espécie de subversão do próprio edital da instituição – que, a cada ano, abre espaço para artistas e curadores submeterem suas ideias de obras e exposições – propondo uma reflexão crítica sobre a prática de elaboração de projetos e processos curatoriais – para editais, ou não.
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A proposta curatorial veio de Luiza Proença e Roberto Winter que, como artistas ainda em início de carreira, viam-se elaborando inúmeros trabalhos na forma de projetos para instituições culturais e suas convocatórias. “O que é curioso é que nunca sabíamos os contextos e motivos que levavam nem à recusa dos projetos nem a sua aceitação”, destaca Luiza. Soma-se a isto o fato de que, geralmente, os artistas trabalham sozinhos e as instituições recebem muitas vezes mais inscritos do que o espaço que podem oferecer, tem-se aí um grande excedente de propostas. Sendo assim, fazer uma exposição só de projetos significa dar espaço a eles e permitir que os artistas possam contextualizar suas produções em relação às dos outros, provendo um espaço de intercâmbio direto. Além disso, torna possível dar ao público o contato com uma dimensão da obra jamais revelada.
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Partindo deste contexto, Luiza e Roberto submeteram seu projeto de curadoria ao edital da Temporada de Projetos 2009 e foram selecionados para realizá-lo entre 6 de outubro e 6 de dezembro deste ano. “De certo modo, é um projeto um tanto ousado, e o Paço percebeu a importância dele”, afirma a curadora. Assim, todos os 322 inscritos no edital foram convidados a expor seus projetos, independente de qualquer resultado de seleção. No entanto, segundo os curadores, cerca de 72 nunca responderam aos contatos e 63 recusaram o convite, deixando 150 participantes, cujos trabalhos estão expostos de maneira a lidar com a pesquisa, a discussão, a apresentação e a mediação da arte contemporânea.
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A intenção, segundo os curadores, é responder a uma série de questões, que envolvem a relevância do projeto dentro da prática artística, a capacidade que ele tem de esclarecer ao público o processo de produção da arte nos dias de hoje, a possibilidade de acesso à obra ou de substituição dela pelo projeto e o potencial formativo, para jovens artistas e para o público em geral, da apresentação de projetos integralmente. “Não pretendemos ter uma resposta para cada uma delas pelo menos até o fim da mostra e das atividades agendadas. Vemos a exposição como uma oportunidade de colocar essas perguntas, debatê-las em público e criar condições para que sejam esclarecidas”, explica Roberto. No entanto, com o andamento da mostra e de seus atividades de suporte, uma das questões já aponta um caminho: a possibilidade de o projeto substituir a obra, seja por contê-la, seja por representá-la, parece não se confirmar. “Hoje, principalmente por meio de uma atividade que estamos realizando com os artistas participantes e o Núcleo Educativo do Paço das Artes, chamada Projeto Portfólio, percebemos que o projeto, na maioria das vezes, não dá conta de apresentar a obra e por isso é incapaz de substituí-la”, conta Luiza. “Porque o artista não consegue escrever sobre sua obra, não sabe documentá-la bem, não possui as ferramentas necessárias para formatar essa documentação, não pode gastar dinheiro para fazer o projeto, ainda não domina o que a obra é para ele próprio etc.”, analisa.
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Por outro lado, como elemento de mediação da relação entre o artista-proponente e o júri de seleção, o projeto pode fornecer um acesso mais esclarecedor à obra do que a própria obra. Mas esta condição esconde um paradoxo: “Carregamos uma herança histórica que dita que o contato entre o público e a obra deve ser imediato, estético (no sentido kantiano), mas, ao mesmo tempo, existe um acordo generalizado de que – pelo menos desde Duchamp – a obra não é capaz de se mediar por completo e necessita, pelo menos, de um aporte contextual que a legitime como tal. Daí surgem contradições da produção da arte contemporânea que permanecem latentes: de um lado, uma busca pelo imediato e, por outro, a busca por formas e possibilidades de mediação”, explica Roberto. Para o curador, expor os projetos evidencia estes contrastes, na medida em que se veem propostas cuja carga conceitual, histórica ou simbólica é grande e presente, mas que não permitem acessos a ela, seja por características formais ou pela falta de mecanismos mediadores.
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A Temporada de Projetos na Temporada de Projetos também está trabalhando com a Internet de uma forma pouco usual entre as mostras nacionais, mantendo, além do site da exposição, um blog e espaços em uma série de plataformas virtuais, que permitem não só acompanhar o andamento da exposição, mas também debater as questões levantadas por ela. Para Luiza, a Internet cumpre também outros papeis importantes na mostra: permite manter o maior contato possível com os artistas participantes, que são muitos, relata o processo de desenvolvimento da curadoria desde a aprovação do projeto, cria um arquivo dos eventos realizados e reúne uma bibliografia sobre os temas envolvidos, “ações ainda muito escassas no Brasil”, segundo a curadora. “Seria ingênuo compreender a Internet como uma ferramenta verdadeiramente pública, já que o acesso a ela é relativamente muito baixo. De qualquer forma, não deixa de se tornar mais e mais claro que a Internet provê ferramentas muito potentes para a disseminação de ideias e o contato mais direto entre as pessoas”, destaca Roberto. Para ele, também a presença na web é uma ferramenta de mediação: permite que as pessoas cheguem na exposição já com uma carga de conhecimento que possibilita um acesso muito mais profundo, além de abrir espaço para que as pessoas saiam da exposição e possam “retornar” a ela no ambiente digital.
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Visitação: 6 de outubro a 6 de dezembro de 2009. Gratuito.
PAÇO DAS ARTES
Av. da Universidade, 1, Cidade UniversitáriaSão Paulo, SP, Brasil
Horário de visitação: terça a sexta, das 11h30 às 19 horas, sábados, domingos e feriados das 12h30 às 17h30